Cresce o número de adeptos à dieta sem carne no Restaurante Universitário da UFRN

A última pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope), encomendada pela Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) em 2018 mostra que 30 milhões – cerca de 14% da população brasileira – são adeptos do vegetarianismo, pessoas que excluem a carne do cardápio, o que significa um crescimento de 75% na última década. Diante dessa realidade, o Restaurante Universitário (RU/UFRN) viu a necessidade de oferecer opções vegetarianas na rotina diária de refeições em 2011, após passar por uma grande reforma. As informações são da Agecom.

Antes de isso acontecer, foi aplicado um questionário para tentar identificar quantos frequentadores do RU optariam por esse tipo de refeição, chegando a um quantitativo de 300 pessoas, cerca de 10% da quantidade total de consumidores. Demanda a qual se manteve até antes da pandemia, variando entre 250 e 300 refeições no almoço e cerca de 100 no jantar.
A diretora nutricionista do RU, Michelle de Medeiros Mendes, afirma que os consumidores não são todos vegetarianos de fato, pois foi observado que, ao longo desses anos, os usuários chegam, olham as variedades e se sentem atraídos também pelo que é oferecido nas opções vegetarianas. Para ela, isso mostra que há o interesse dos não vegetarianos por alimentos dessa dieta. A linha vegetariana do RU é ovolactovegetariana, que consiste no consumo de bens vegetais, ovos, leite e seus derivados. E, nas sextas-feiras, a proposta é investir em preparações veganas.
Causa animal
Rayane Pontes, estudante do curso de Letras e usuária do RU, afirma que aderiu à dieta vegetariana em 2016, logo após buscar mais conhecimento por essa prática e ter contato sobre a causa animal e ambiental. Ela conta que, como a maioria das crianças, sempre gostou de animais e a questão principal foi entender que todas as espécies de animais são seres com direito a viverem uma existência digna e plena, assim como os humanos. No fim, existe uma série de outras motivações, como cuidar da própria saúde, mas questões ambientais e animais são as que a motivaram inicialmente, conta a estudante.
A experiência dela como frequentadora do Restaurante é positiva, pois, para ela, as opções são sempre muito completas e nota-se que existe um cuidado em tentar oferecer novas opções, fazendo com que mesmo as pessoas que comem carne tenham interesse em experimentar as possibilidades desse cardápio. Quando Rayane se tornou vegetariana, não era tão comum encontrar opções prontas e variadas em restaurantes e mercados, o que tornava mais difícil a alimentação fora de casa. “Mas agora, felizmente, o mercado está ficando mais variado e se abrindo a esse nicho”, complementa.
Matheus Eduardo, estudante do curso de Biblioteconomia, é ovolactovegetariano há cerca de cinco anos e relata que, nos lugares mais centrais da cidade, existe mais variedade de opções para vegetarianos, mas, em locais mais longe do centro, o mais comum é encontrar produtos de origem animal. No entanto, no RU é diferente. Ele frequenta o Restaurante desde o segundo semestre de 2022 e explica que é visível o esforço da equipe para elaborar pratos diversos todos os dias. “Eu acho tudo muito honroso e bacana, acho muito importante essa atitude”, afirma.
Implementação de um cardápio vegetariano
Por trás desse menu, existe um processo aprofundado e minucioso. A implementação é realizada após testes com ingredientes adquiridos a partir de sugestões de nutricionistas e estagiários do curso de Nutrição, como explica Michelle de Medeiros Mendes. As dietas são acompanhadas por pessoas adeptas do estilo de vida vegetariano, além de profissionais que analisam as refeições para não haver deficiência de vitaminas ou minerais nos pratos oferecidos.
A alimentação do Restaurante é estruturada sob o padrão composto por salada, prato principal convencional, prato principal vegetariano, suco e fruta. O RU faz parte da área da nutrição coletiva, que pensa a elaboração de pratos para a coletividade sadia, visando atender às necessidades nutricionais da clientela que realiza as refeições no local, calculadas com base na média de idade, peso e estatura.
A diretora relata que o RU sempre recebe discentes da UFRN e da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi (Facisa) para atuação como estagiários do curso de Nutrição. Alguns, conta ela, são adeptos do vegetarianismo ou veganismo e auxiliam na procura por novas opções para análise. No entanto, apesar das contribuições para as preparações vegetarianas, nem todas são incluídas no cardápio.
“Algumas preparações dão certo, mas vemos que não conseguimos reproduzir por serem processos minuciosos, e o tempo de preparo que temos na unidade não deixa a gente chegar à excelência da preparação, então a gente opta por não implantar aquele prato”, afirma Michelle. A nutricionista cita como exemplo o tofu de ervilha, que, apesar do sucesso no preparo individual, quando realizado em grandes proporções, não foi viável para a implantação na dieta. Existe uma preocupação também quanto à substituição de pratos que não são bem aceitos pela comunidade do RU.
Cláudia Santos Rosas, estagiária do RU e adepta do vegetarianismo há oito anos, conta que sua maior motivação para cursar nutrição se dá por sentir dificuldade em encontrar um profissional da nutrição que tenha conhecimento específico sobre esse tipo de alimentação, ficando carente de orientações alimentares que a suprisse com micronutrientes.
“Foi aí que resolvi ser essa profissional e poder ajudar pessoas como eu”, comenta. Durante o tempo em que atuou no RU, Cláudia utilizou seu conhecimento como estudante da área e seguidora desse estilo de alimentação ao seu favor para implementar preparações vegetarianas e veganas.
No momento, o RU não está servindo a sua capacidade completa. Atende aos estudantes da Residência Universitária e, agora em outubro, foi reaberto para os alunos prioritários de acordo com o Cadastro Único. A previsão é de que essa capacidade retorne a 100% em novembro, quando os pagantes voltam a utilizar o serviço de refeição.
Estilo de vida
Não há pontos negativos na dieta vegetariana, mas fazer essa transição sem o auxílio de um nutricionista capacitado na área pode causar alguns prejuízos à saúde, principalmente relacionado ao aporte de micronutrientes e proteínas. “Essa dieta não é sinônimo de vida saudável, pois a indústria de alimentos tem uma infinidade de produtos ultraprocessados e fast foods para esse público”, explica Cláudia.
Ao ser praticada adequadamente, composta principalmente por alimentos in natura e minimamente processados, a dieta vegetariana traz muitos benefícios à saúde, por exemplo, o efeito cardioprotetor e a diminuição dos níveis séricos de triglicerídeos.
As dietas vegetariana e vegana propõem maior consumo de frutas, vegetais, legumes e cereais integrais, já a carne e alimentos de origem animal, por sua vez, são excluídos da rotina alimentar dos indivíduos adeptos. Michelle destaca os impactos da ingestão da carne não somente na preparação dos pratos, como também na produção e criação de animais para consumo. “Ela tem um impacto ambiental muito grande, desde a criação do gado até a chegada à mesa do comensal”, defende. Para a nutricionista, esse estilo de vida traz benefícios por pensar também no impacto ambiental.
Na adaptação de uma nova rotina alimentar, é necessário que o indivíduo tenha acompanhamento de nutricionistas para que não haja falta de nutrientes, visto que alguns minerais presentes em carnes ainda não têm equivalentes nos produtos vegetais, conta Michelle.
A partir de sua experiência, Rayane Pontes conta que as mudanças foram apenas a retirada de carnes da dieta e adição de proteínas vegetais e vitamina B12. “É normal pensar que é muito difícil e que parar de consumir carnes e ovos gera uma grande mudança, mas, se a gente parar pra observar, boa parte da nossa alimentação já é de base vegetal”, argumenta.
“Quando se fala de benefícios do vegetarianismo ou qualquer coisa relacionada à alimentação, as pessoas pensam em saúde e acho que essa foi a primeira coisa que eu percebi”, diz Matheus Eduardo. Mas, para ele, os benefícios foram muito além disso. O estudante conta que a mudança de estilo de vida gerou uma consciência ambiental muito grande, no sentido de ter empatia com outros seres vivos que não são humanos e entender o impacto ao meio ambiente.
No processo de se tornar vegetariano, a indicação é começar a mudança na rotina alimentar a partir da procura de um acompanhamento de especialistas. Matheus defende a busca por profissionais e que o melhor é começar a transição aos poucos. Ele chama atenção, também, para ações individuais como um efeito positivo no meio ambiente e na vida pessoal. “Toda pequena ação gera uma impressão positiva. Passar um dia da semana sem comer carne já gera um impacto ambiental gigantesco, até o fato de não jogar lixo na rua gera um efeito”, argumenta.