Período junino acende alerta sobre queimaduras

Até maio deste ano, o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel recebeu 369 pessoas com algum tipo de queimadura no Centro de Tratamento de Queimados (CTQ). Agora, com o início de junho e dos festejos de São João, a preocupação aumenta para médicos e bombeiros que atuam no combate a este tipo de acidente.

O CTC recebe uma média de 20 a 30 vítimas de acidentes graves relacionados a fogos de artifício ou queimaduras a cada período junino. De acordo com o Marco Almeida, cirurgião plástico do CTQ, é preciso atenção com os objetos desta época. “Não existem fogos inocentes. Então, eu jamais daria pra uma criança um chumbinho, um traque, um chuveirinho, porque mesmo esses fogos mais simples podem causar lesões irreversíveis, até mesmo uma cegueira se atingir um olho”, alerta. Segundo Almeida, as brincadeiras juninas são culturais, “mas têm que ser repensadas porque muitas crianças têm tido lesões graves e importantes”.
Normalmente, segundo o médico, as queimaduras por uso de fogos de artifício, fogueiras e rojões são de segundo e terceiro grau. Os ferimentos de segundo grau podem ser superficiais, com cicatrizes que duram de 10 a 14 dias, e profundas, durando cerca de 21 dias para sarar. Já no terceiro grau, o comprometimento é em todas as camadas da pele, até a gordura ou mais profundo. “E normalmente é quando a gente tem que fazer os enxertos, é quando tem muita cirurgia reparadora, é quando tem as sequelas”, diz Almeida.
Em 2020, com os decretos governamentais que proibiam o uso de fogos e fogueiras, além das aglomerações, o centro não registrou nenhuma internação por queimadura grave causada por fogueira ou fogos de artifício. O registro foi inédito: foi a primeira vez, em 47 anos, que o Walfredo não recebeu pacientes com esse tipo de acidente na maior unidade pública de saúde do Estado. “Só que agora está liberado, e tem uma euforia muito grande das pessoas de poderem participar de festas”, diz o cirurgião. Ele lembra que o manuseio de fogos ou objetos pirotécnicos é desaconselhado por leigos: “tem que ser o pessoal habilitado, treinado”.
A recomendação é a mesma do Corpo de Bombeiros. Segundo o Tenente Arthur Vasconcelos, Oficial de Operações da corporação, as crianças são motivo de preocupação durante o São João. “Aquele artefato tem um tempo para ser acionado e às vezes passa um pouquinho do tempo. A pessoa fica achando que não funcionou, mas ele pode vir a estourar no momento que a pessoa está mais próxima”, diz. Por isso, segundo o oficial, não se deve “deixar a criança só e não soltar os fogos de artifício num ambiente fechado”.
De acordo com o tenente, as ocorrências nos Bombeiros por fogos de artifício tem sido num “nível aceitável”, até o momento. “A gente tem uma questão da pandemia, que ainda está numa reta final, mas a aglomeração de pessoas está um pouco menor. A tradição de se acender a fogueira foi reduzida, isso a gente não tem como negar, nesses últimos dois a três anos”, afirma. “Então pelo menos a população, até o presente momento, tem colaborado e o número de ocorrências relacionadas a isso está bem baixo”.
Centro de Queimados tem ocupação de 75%
Até esta segunda-feira (13), o Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) do Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel estava com 75% dos leitos ocupados. São 16 leitos disponíveis para vítimas de queimadura, e 12 com acamados. Até o momento, as causas de internações são por acidentes domésticos, choques elétricos e acidentes pelo uso de etanol. São 30% de casos de queimaduras por álcool líquido, 30% de queimaduras decorrentes de acidente com eletricidade, e 30% por etanol combustível, que tem sido usado por algumas pessoas para cozinhar, o que é proibido. Até semana passada, a unidade estava com lotação máxima.
Na Enfermaria Pediátrica do CTQ, a pequena Brunna Lins se recupera de uma queimadura de segundo grau que sofreu no dia 8 de junho. Durante o almoço, uma panela de arroz que estava no fogão caiu sobre ela. A criança queimou principalmente o peito e a barriga e hoje se recupera bem. Mas, segundo a mãe, Elayne de Souza Silva, no começo não foi assim. “No começo, quando a gente chegou aqui, até o quarto dia, ela nem falava. Ela tomava anestesia e só apontava as coisas. Ela fala tudo, é muito interativa. E está num recomeço”, afirma.
Além dos cerca de 370 casos de queimaduras neste ano, o Walfredo Gurgel registrou 681 casos em 2019, sendo 417 causados por líquido quente. Em 2020, foram 611 queimaduras e 301 por líquido quente.
Para Marco Almeida, o importante é manter os cuidados. A prevenção é uma palavra de ordem, porque uma vez que houve a queimadura, sempre vai ter sofrimento”, diz ele. “Sofrimento emocional, sofrimento físico. Normalmente são muitas cirurgias. O custo de um tratamento de um paciente vítima de queimadura é elevadíssimo”, avisa o cirurgião.
Por isso, Almeida espera que os investimentos no CTQ melhorem nos próximos meses com uma verba que a unidade deve receber. Em 14 de abril, o Hospital Walfredo Gurgel foi habilitado como Centro de Referência em Assistência a Queimados. A portaria do Ministério da Saúde fará o local receber um recurso anual de R$1.972.246,38. Até então, não existia um recurso específico do Walfredo Gurgel voltado para o Centro. “Existe uma demanda imensa de gente necessitando de cirurgias reparadoras, então o Estado tem que prestar atenção, tem que se preocupar com essa necessidade”, alerta.